A Fabulosa Espera de Anne Marie

Variações aleatórias entre o muito bom e o muito mau... mutações emocionais constantes... o paradoxo da normalidade

lundi, juillet 31, 2006

À noitinha...

... a minha casa está calada.
As paredes sentiam saudades minhas, eu sei, eu sinto-as a aproximarem-se para um leve toque quando não as posso ver. Não fazem barulho mas sinto uma ténue e muito discreta sombra atrás de mim. E é apenas por puro respeito, não creio que seja timidez. As paredes não são tímidas, ou sujeitavam-se a um triste desígnio, sempre expostas. Reservadas, direi. As paredes brancas do meu palácio são reservadas.
Oiço o ruído da electricidade a percorrer as paredes e o candeeiro que me dá luz para escrever. O barulho do meu pc, cansado e farto dos meus dois dedos frenéticos a teclar. A inveja dos outros dedos que não acariciam o teclado. A minha incapacidade de ser democrática, até com a própria mão.
O som pequenino do meu frigo. Som pequeno que ecoa pequeninamente pela minha sala. Não há muralhas entre a cozinha e o sitio onde estou. As ondas sonoras percorrem livremente a casa e dançam em surdina surda e muda o que querem, sem que eu sequer as oiça e reconheça. Apenas percebo que me envolvem e que fazem parte da minha realidade aqui, nesta sala de ruído livre, reservada por paredes brancas discretas.
O silêncio interrompido por estas propostas de barulho deixa-me sonolenta. O que mais oiço depende de mim. Os dois dedos que freneticamente batem nas teclas do pc. Escrevo depressa, com vigor e rigor, mas não uso todos os dedos. Os não usados estão tristes e temem a extinção. Eu asseguro-lhes que todos têm a sua função e que trabalham em equipa. Talvez os dedos indicadores sejam os escritores, outros dois os pintores, outros os cantores... tarefas para todos os dedos, democracia manual.
O meu pc volta a suspirar e recolhe energia para funcionar internamente. Ultimamente está cansado e temo que tenha apanhado uma corrente valente de energia. Anda desassossegado e entupido. Demora muito tempo a acordar e também a adormecer. Já instalei um doutor-detective para investigar este caso de saúde ou falta dela. Mas ainda não há conclusões médicas. O meu pc anda a sofrer de um mal desconhecido. Provavelmente uma depressão derivada de excesso de informação e falta de disponibilidade para deixar correr os programas presentes livremente. Talvez o meu pc esteja a atravessar uma crise de identidade. Talvez queira agora ser outro tipo de máquina.... será que gostaria de ser uma playstation? um aspirador inteligente? Talvez o meu pc tenha apanhado o mal de não aceitar o que é. Vou continuar a estar atenta. Talvez seja apenas um vírus sazonal de insatisfação global... isto de andar muito pela net pode trazer consequências nefastas para um simples computador. Ver o mundo e não o sentir... pode ser um problema...
(Anne Marie tomba por cima do seu teclado e adormece... e isto acontece logo nos primeiros parágrafos do texto)

2 commentaires:

  • À 19:54 , Blogger MEHC a dit...

    Olha, Anne Marie, se mais não fora, por este post, diria que tu és uma verdadeira escritora! Tens talento, imaginação, sentido de humor e excelente capacidade de observação do mundo à tua volta.
    Parabéns. Já pensaste ir além de um blog?

     
  • À 06:32 , Blogger Anne Marie a dit...

    Bem.. Obrigada!!!! Isso seria o sonho de uma vida! Mas por enquanto, só coragem tenho para este blog. Mas mais uma vez obrigada, fico toda babada!!!!! Beijinhos!!!!

     

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