A Fabulosa Espera de Anne Marie

Variações aleatórias entre o muito bom e o muito mau... mutações emocionais constantes... o paradoxo da normalidade

samedi, juin 24, 2006

Maria Antonieta (5.1.1919 - 21.6.2006)

Era uma avó distinta. Era formal e exigente com os outros. Era vaidosa e selecta.
Nunca se habituou à vida sem criados, bailes e mordomias. Não gostava de sol em excesso e por isso acho que escolheu morrer neste primeiro dia de Verão.

Quando éramos pequenos, motivava a nossa mãe a vestir-nos de igual (odeio xadrez!) e, quando começámos a ter sardas, desgostosa, chegou a comprar uma qualquer mistela para aplicar nos rostos infantis dos netos. Felizmente, os nossos pais não aprovaram este seu capricho e hoje todos temos sardas...

Mas foi uma avó amiga! Pregava partidas no Carnaval! Tinha um sentido de humor muito apurado. Fazia o melhor bolo mármore do mundo e nos aniversários confeccionava o mítico bolo das 3 camadas, coberto com geassa colorida (hmmmm, adorava!)! Era a pessoa que cozinhava o melhor arroz de atum do universo! Contava histórias fascinantes dos tempos de África, alternando entre as aventuras na selva e o glamour das festas...

Lembro-me que, quando entrei para Psicologia, perguntou-me se seria capaz de analisar um sonho recorrente, que a perseguia amorosamente desde os seus 26 anos: a imagem do meu Avô – o Avô Mário – que apenas reconheço de fotografias, com ela, em feliz harmonia, vivendo um casamento romântico e idílico, como se na realidade, este não tivesse sido interrompido brusca e precocemente. Ao fim de mais de 50 anos, a saudade aparecia todas as noites, impedindo-a de se dedicar, com mais determinação e energia, aos que a rodeavam... talvez fosse isso...

No Natal passado ainda era a Avó Neta. Depois ficou cansada, cada vez mais exausta e nem os carinhos, beijinhos, manicures improvisadas, revistas fúteis ou o fado a motivavam...
O corpo pedia paz e o olhar foi silenciando as exigências.
A última vez que estive com ela não a consegui acordar. Dormia profundamente, com um ar sereno e um sorriso sossegado. Não me despedi dela. Podia dizer que não a quis acordar, mas na verdade, até tentei. Mas não consegui.

Não sei bem o que sinto. Espero que não tenha tido medo de morrer. Espero que o Avô Mário tenha posto o seu fato mais garboso e a tenha ido esperar à porta do Céu com umas flores e vontade de aproveitar os anos de amor suspensos... espero bem que sim!

5 commentaires:

  • À 10:49 , Anonymous Anonyme a dit...

    Porra Ana, e eu que estava a conseguir não chorar.
    É lindo!


    Sis

     
  • À 18:50 , Anonymous Anonyme a dit...

    Bonito! Que final feliz! Seguramente, o avô Mário fez as honras da casa e ambos já vivem o sonho!
    PS. Enfim, deixaste-me com um nó...

     
  • À 21:11 , Blogger Anne Marie a dit...

    Beijos para as três!!!! Não é para chorarem ou ficarem com nós! É para sorrirem e ficarem tranquilas!!!

     
  • À 05:53 , Anonymous Anonyme a dit...

    Um grande beijo de solidariedade, enviado de Santa Luzia com vista para o infinito.

     
  • À 20:01 , Blogger MEHC a dit...

    Que bonito texto dedicaste à tua avó Neta.É quase certo que ela e o seu Mário estão juntos, pelo menos no nosso desejo, não é?
    Ahh, e estudaste Psicologia, estou a ver. Também tenho uma filha psicóloga. Tens idade para ser minha filha,'tás a ver?

     

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